FONTE: RFI
O Índice Mundial da Liberdade de Imprensa foi divulgado esta sexta-feira, 3 de Maio, pela organização não-governamental Repórteres Sem Fronteiras (RSF). O relatório indica que Angola, que no ano passado foi o pior classificado dos países afro lusófonos no mapa da liberdade de imprensa, subiu 21 posições. Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique desceram no Índice.
Assinala-se esta sexta-feira, 3 de Maio, o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. A data foi criada em 1993, com uma decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas. Essa decisão celebra o Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e marca o dia da Declaração de Windhoek feita por jornalistas africanos em 1991 afirmando os princípios da liberdade de imprensa junto da UNESCO.
Angola, que no ano passado foi o pior classificado dos lusófonos no mapa da liberdade de imprensa, subiu 21 posições para 104.º lugar (125.º em 2023).
Cabo Verde desceu, para a 41.ª posição (33.ª em 2023). A Guiné-Bissau desceu 14 posições em relação ao ano anterior e ocupa a 92.ª posição da tabela. Moçambique registou uma descida de três posições, ocupando agora o 105.º lugar da tabela publicada todos os anos, que não inclui São Tomé e Príncipe.
Em Angola há um engajamento maior, mas continuamos na luta
Angola melhorou a sua posição na classificação anual da Repórteres Sem Fronteiras e subiu 21 lugares para a 104° posição, contra o lugar 123 que ocupava em 2023. A RSF dá conta de casos de censura e de controlo de informação, mas nota melhorias. Para Luísa Rogério, jornalista angolana que integra a Comissão Executiva da Federação Internacional dos Jornalistas, notam-se melhorias junto da jovem geração de jornalistas em Angola.
"A avaliação não difere muito da do ano passado. Sinto que há mais liberdade cerceada e que continua a haver retrocessos. Mas o facto de haver um engajamento maior, o facto de liberdade de expressão, embora não se reflicta necessariamente nos meios de comunicação, ter aumentado já é um bom sinal porque há um grande questionamento, mesmo em relação aos jovens profissionais, inclusive estudantes. Isso é um bom sinal de que há um ganhar de consciência de classe em relação à situação da imprensa que nos faz remeter para a possibilidade de discutirmos cada vez com mais frequência as questões ligadas à imprensa em Angola, tanto a imprensa e os jornalistas", explica Luísa Rogério.
Segundo a jornalista angolana, "se tivesse que fazer um retrato da liberdade de imprensa actualmente, diria que continua bastante condicionada por factores políticos, factores económicos e, claro, que em Angola a fronteira continua a ser muito ténue porque quem não tem poder político, não consegue ter económico de forma alguma. Mas, como se diz, continuamos na luta".
Cabo Verde desceu para a 41.ª posição, contra a 33.ª em 2023, no índice da liberdade imprensa da Repórteres Sem Fronteiras. A RSF aponta que os responsáveis dos órgãos públicos são nomeados directamente pelo poder político. Geremias Furtado, presidente do sindicato dos jornalistas de Cabo Verde, denuncia, ainda, casos de pressões sobre jornalistas, precariedade laboral e auto-censura.
"A situação do meu país, como revela o relatório, caiu oito posições. É uma descida que nos preocupa, mas também é uma descida que poderá ser vista como um alerta, como um incentivo para o debate que há muito se tem ignorado fazer-se sobre esta questão do jornalismo e o ambiente mediático em Cabo Verde. Fala-se da questão do Conselho Independente da rádio e televisão pública, um órgão criado para nomear os gestores dessa empresa RTC. Entretanto, diz que é independente, mas o governo nomeia duas pessoas directamente e outras duas de forma indirecta, digamos assim, e achamos que esta composição deve ser revista. Fala-se também na questão dos ataques a jornalistas nas redes sociais, a precariedade laboral, autocensura, pressões política"descreveu Geremias Furtado.
"Pensamos que é preciso reflectir sobre a própria agenda dos jornalistas. O que é que os jornalistas estão a cobrir. Esta questão do excesso de cobertura política, tudo isto devemos reflectir e saber, de facto, o que é que devemos fazer para melhorar o ambiente mediático em Cabo Verde", concluiu.
De acordo com Índice Mundial da Liberdade de Imprensa, a Guiné Bissau desceu este ano 14 posições, encontrando-se em 92.º lugar. Luís Vaz Martins, advogado e presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, reconhece que a imprensa guineense tem sido massacrada através de ataques directos do Presidente Umaro Sissoco Embaló e do seu regime.
"O olhar que eu tenho é um olhar objectivo daquilo que tem acontecido nos últimos nos últimos anos, na Guiné-Bissau, onde efectivamente não há nem liberdade de expressão, nem liberdade de imprensa. Aliás, a imprensa tem sido massacrada através de ataques directos por parte do próprio Umaro Sissoco Embaló e do seu regime. Quando não o faz directamente, instrumentaliza os órgãos administrativos a fazê-los, encerrando órgãos de comunicação social, com perseguições, tortura contra os próprios homens da comunicação social e bloguistas", descreve Luís Vaz Martins.
"Penso que na Guiné-Bissau, tudo quanto tem retratado os relatórios nessa matéria, tem havido uma regressão muito aprofundada sobre aquilo que é a liberdade de imprensa. Aquilo que espelham os relatórios é o retrato fiel daquilo que tem acontecido na Guiné-Bissau nos últimos tempos", concluiu.
Moçambique registou uma descida de três posições na classificação publicada pela RSF, ocupando agora o 105° lugar. A organização não-governamental destaca a posição preponderante dos órgãos controlados pelo poder e a precariedade de muitos medias independentes. O Secretário-Geral do Sindicato nacional dos jornalistas de Moçambique, Faruco Sadique, observa que tem havido tentativas de limitar a margem de manobra dos jornalistas, mas considera que são casos isolados.
"É preciso que haja uma luta bastante grande. Nos últimos tempos tem havido alguns casos, ainda que isolados, mas preocupantes, de situações em que se tenta cercear a liberdade de trabalho dos jornalistas, mas cremos que não é ainda uma situação que se possa generalizar", descreveu.
Questionado sobre o desaparecimento de jornalistas, Faruco Sadique lembra que se trata de "casos antigos",lembrando, no entanto, que "no ano passado faleceu um colega. Não ficou claro de que forma é que ele foi morto. A polícia ainda não se pronunciou em definitivo sobre este caso, mas há realmente essas situações que evidenciam alguma preocupação. Posso salientar que há uma cada vez maior presença da comunicação social, até através de rádios comunitárias por quase todo o país, mas algumas delas encontram dificuldades, nomeadamente do ponto de vista de formação".
O Secretário-Geral do Sindicato nacional dos jornalistas de Moçambique antevê um período de maior pressão para os jornalistas neste ano eleitoral: "Para uma comunicação social desprovida de meios financeiros, técnicos, humanos, para fazer a cobertura que se exige. Portanto, é um trabalho realmente exigente".
O sector da comunicação social em São Tomé e Príncipe vai mal
Em São Tomé e Príncipe, os jornalistas também assinalaram o dia Mundial da Liberdade de Imprensa, num painel onde foram denunciados alguns atropelos à liberdade de imprensa no arquipélago.
O Presidente do Conselho Superior de Imprensa, disse esta sexta-feira que o sector da comunicação social em São Tomé e Príncipe vai mal. Reconhecendo os vários diagnósticos feitos sobre a comunicação social, Edmar Teixeira, referiu que o estado de coisas mantém-se inalterado: “Apesar dos vários diagnósticos, o estado de coisas mantém-se inalterado, sem um horizonte breve de resolução, pois os problemas são de todos conhecidos.”
Já o presidente da Associação dos Jornalistas Santomenses, Juvenal Rodrigues salientou que continua engavetada no parlamento são-tomense a Lei de Acesso à Informação: “Houve comprometimento a título privado e público que o assunto seria agendado para discussão na Assembleia Nacional. No último momento abortou.”
Para a melhoria da comunicação social, Edmar Teixeira, elenca várias vias como a dignificação dos jornalistas e técnicos da comunicação social e a transição da TVS do analógico para digital: “A dignificação da classe de jornalistas e técnicos, a transição do sistema analógico para o digital contribuirão, sem dúvida, para a melhoria do sector da comunicação social.”