FONTE: RFI
Com "a queda do governo e a dissolução da Assembleia" os guineenses vivem mais dificuldades económicas, conta Fildago Djú, que trabalha num restaurante em Quinhamel.
"Esta situação só nos vai trazer mais complicações em termos económicos. Antes vinham mais clientes ao restaurante, mas depois da dissolução da Assembleia e do governo há menos pessoas porque as pessoas estão com medo. Não quero entrar num discurso de dizer que vivemos numa ditadura, mas a tirania não pode reinar", acredita.
Fildago Djú lamenta que os políticos não se preocupem com as condições de vida dos guineenses; "desde os anos 80 até agora, os políticos preocupam-se em comprar casa em França, Espanha, Inglaterra, mas não estão preocupados em resolver os problemas sociais do país".
"Estamos numa quadra festiva e o dinheiro não está a circular. Com a queda do governo, o país está a caminha para o caos", conclui.
"Vivemos muitos problemas. Um saco de arroz custa 23.000 FCA, 35 euros. Se não trabalhasse no campo, a minha vida seria muito mais difícil", conta Renald, acrescentando que "quando eles [políticos] precisam de nós, durante as eleições, eles vêm até cá apresentar os programas, mas depois não fazem nada", aponta Renaldo.
A instabilidade política tem agravado as condições de vida de muitos guineenses que se queixam de falta de recursos, trabalho e agora de não haver circulação de dinheiro.
"Comunidade internacional pode ajudar a salvar direitos humanos"
Os defensores dos direitos humanos na Guiné-Bissau estão preocupados com a detenção de 37 cidadãos em prisão preventiva há mais de um ano e meio, alegadamente por envolvimento na tentativa de golpe de Estado de 1 de Fevereiro de 2022. O advogado e Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, Luís Vaz Martins, condena estas "detenções arbitrárias".
No dia 1 de Fevereiro de 2022, homens armados atacaram o Palácio do governo da Guiné-Bissau durante uma reunião do conselho de ministros na qual participavam o antigo chefe do executivo, Nuno Nabiam, e o Presidente, Umaro Sissoco Embaló. Foram detidos 37 pessoas, acusadas de implicação na intentona.
Em Setembro, os detidos foram transferidos para a base da Força Aérea Nacional. A transferência acontece depois do pedido do Tribunal Militar Superior ao Ministério do Interior, para transferir os reclusos das celas da Segunda Esquadra da Polícia de Ordem Pública por motivos de segurança e melhores de condições prisionais. O advogado tem reservas sobre esta questão, uma vez que "há três semanas os detidos não tinham acesso a banhos de sol e tinham dificuldades em ter acesso à alimentação".
O advogado e Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, Luís Vaz Martins, sublinha que "a esmagadora maioria dos implicados no suposto acto de tentativa de subversão da ordem constitucional são civis. Não houve nenhum mandado judicial que permitisse esta deslocação das instalações do ministério do Interior para a base Aérea. Aquela decisão não partiu de nenhum magistrado. Foi uma decisão administrativa por parte do Presidente do Tribunal Superior Militar".
Dos 37 detidos, 11 são acusados formalmente. Os restantes civis "não são acusados de nada. Há despachos de magistrados a ordenar a soltura desses 26 e atentam o cumprimento da decisão judicial".
Desde Fevereiro de 2022, "houve momentos em que os detidos se preparavam a deixar a cela, por via de uma decisão judicial, mas depois alguém chegava para dizer que havia ordens superiores que não permitiam o cumprimento do despacho", recorda Luís Vaz Martins, lembrando, ainda, que existem "ordens superiores". "Nunca fazem referência a quem, mas todos sabemos que é o poder político, o chefe de Estado Umaro Sissoco Embaló", acredita.
Luís Vaz Martins lembra que o prazo legal para qualquer prisão preventiva é de seis meses. "O prazo legar da prisão preventiva triplicou, um ano e oito meses praticamente. Sobre este caso não se está a cumprir a lei".
O início do julgamento foi adiado por não existirem condições logísticas, devido às obras que decorrem em Bissau Velho. "Esta é a desculpa mais barata a que assisti na minha vida. Alguém quer, a todo custo, deslocar o processo para o Tribunal Militar, em vez de ser o Tribunal Regional de Bissau. Os militares parecem estar alinhados com a violação dos direitos humanos, não nos resta mais recursos do que pedir pela intervenção da comunidade internacional para ajudar a salvar a democracia e a salvar os direitos fundamentais da Guiné-Bissau".
"A desculpa de obras em curso é uma desculpa e não tem nada que ver porque estamos perante uma violação gritante dos direitos humanos - como alertaram as Nações Unidas. Alguém tem que ser obrigado a respeitar os direitos fundamentais daquelas pessoas", defende.
O Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau lamenta que a situação dos direito humanos na Guiné-Bissau "se tenha degradado nos últimos quatro anos. Hoje em dia quem tente expressar a sua opinião é capaz de ter consequências graves; perseguições, tentativas de assassínios, raptos ou espancamentos".
Os advogados têm vindo a ser ameaçados. "Foi o caso do Marcelino Intupé que esteve exilado durante vários meses em Portugal. Os familiares não têm tido acesso aos seus entes queridos. Sabemos que recentemente um deles esteve a passar muito mal e não teve acesso a cuidados de saúde", concluiu.