Chefiei a Missão de Observação da União Africana às eleições na Guiné-Bissau, tudo estava claro antes da suspensão do processo eleitoral, pois a votação foi pacífica e transparente mas, inesperadamente o clima político alterou-se culminando com a intervenção militar e o encerramento das fronteiras.
A nossa missão da União Africana chegou ao país a 19 de Novembro e trabalhou com a Comissão Nacional de Eleições, o Presidente Sissoco Embaló, membros do Governo e representantes diplomáticos. A orientação inicial foi promover calma e segurança para proteger os votantes.
Os observadores estiveram presentes em todas as sete regiões e em Bissau. Todas as missões internacionais, incluindo CEDEAO, CPLP e G7+, chegaram à mesma conclusão: o dia da votação decorreu de forma pacífica, livre e ordeira. Na mesma senda a segurança manteve-se discreta e nenhum eleitor foi impedido de exercer o seu direito.
Tudo corria de normalmente, as mesas funcionavam no exterior dos edifícios, o que permitiu total visibilidade do processo. A contagem dos votos foi pública e acompanhada localmente, com a equipa da UA a visitar mais de vinte assembleias demostrando a maturidade democrática pelo eleitorado guineense.
Abruptamente o ambiente começou a deteriorar-se depois da divulgação preliminar dos resultados. Enquanto a missão se reunia com um dos candidatos, surgiram informações de tiroteios na capital. Os disparos ocorreram perto da sede da CNE e da zona presidencial.
A missão tentou deslocar-se ao local, mas foi travada por forças de segurança que já tinham assumido o controlo da área. Pouco depois, o processo eleitoral foi suspenso sem explicação clara, apesar de estar na fase final.
Seguiu-se um clima de incerteza, marcado pela presença militar, recolher obrigatório e fecho das fronteiras. Apesar disso, voos internacionais começaram a ser autorizados a aterrar, o que interpreto como sinal de contenção.
Perante esses acontecimentos, nós como representantes da União Africana, a CEDEAO e o Fórum dos Anciãos emitimos uma declaração conjunta a lamentar a situação e a apelar ao restabelecimento do processo eleitoral até à sua conclusão.
A missão decidiu permanecer em Bissau, ao contrário de outras delegações que abandonaram o país, para garantir que a UA estaria representada até à clarificação total dos factos.
Contudo, existe espaço para diálogo e que a solução caberá aos guineenses. Esclarecer que o papel da missão é apenas observar, não mediar nem proclamar resultados. O relatório final já foi remetido à União Africana, que avaliará os próximos passos.
(*) Filipe Nyusi foi o Chefe da Missão de Observação Eleitoral na Guiné-Bissau