domingo, 2 de março de 2025

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OPINIÃO: A União Africana pode prosperar na nova ordem mundial. Mas primeiro, há três coisas que precisa de mudar


Por: Carlos Lopes (*)

FONTE: THE CONTINENT



A União Africana tem dado passos significativos na sua missão de unir o continente e de o impulsionar para um futuro próspero.


Um grande exemplo disso é a criação da Zona de Comércio Livre Continental Africana, que lança as bases para a cooperação económica continental. 


No entanto, existem problemas mais profundos e subjacentes que dificultam a realização de novos progressos. Se estes não forem resolvidos, o organismo continental continuará a ser um observador passivo na cena mundial.


Dadas as rápidas mudanças na geopolítica mundial que estão atualmente em curso, é mais importante do que nunca que a União Africana seja capaz de proteger e promover eficazmente os interesses deste continente e do seu povo. 


Estas são as três questões que a UA precisa de resolver em primeiro lugar. 


A mais crítica é também a mais controversa: o princípio da subsidiariedade, que é o obstáculo mais persistente a uma integração regional efectiva. Trata-se da ideia de que os organismos regionais - como a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental e a Comunidade da África Oriental - devem desempenhar um papel de liderança na resolução de conflitos dentro das suas próprias esferas.


Este princípio tem sido repetidamente minado na prática, com os países vizinhos a utilizarem-no com demasiada frequência para promoverem os seus próprios interesses, em vez de contribuírem para a construção da paz regional.


O princípio da subsidiariedade também tem sido utilizado como arma pelos Estados que o invocam para impedir que a União Africana, ou outros actores internacionais, desempenhem um papel mais ativo na resolução de conflitos. Esta é uma das razões pelas quais os esforços regionais para desativar as guerras no Sudão e na República Democrática do Congo falharam, com consequências tão devastadoras.



O segundo grande desafio é a voz fragmentada e ineficaz de África na cena mundial. Em vez de apresentar uma frente unificada nas conversações internacionais, a posição de África é frequentemente fragmentada, reduzindo a sua influência e poder de negociação.

E seja nas negociações sobre o clima, nas conversações comerciais ou nos esforços para reformar o sistema financeiro internacional, a abordagem de África gira frequentemente em torno de pedir mais ajuda - sem desafiar as barreiras estruturais que continuam a impedir o seu desenvolvimento. 

Por exemplo, nas negociações sobre o clima, a posição de África tem-se centrado tipicamente em pedir mais apoio financeiro, apesar de as promessas feitas em acordos anteriores não terem sido honradas. Este enfoque na ajuda, em vez de reformas regulamentares que apoiariam a industrialização e a transformação económica a longo prazo, mantém África presa num ciclo de dependência. 


Agora que a ajuda está a desaparecer - tanto os Estados Unidos como o Reino Unido estão a reduzir drasticamente o seu financiamento para o desenvolvimento internacional, com outros países ricos potencialmente a seguir o exemplo - a UA precisa de encontrar outra abordagem mais assertiva. 


A chave para isso pode estar na conversa atual em torno das energias renováveis e dos minerais essenciais. A África está mais uma vez a ser posicionada como um mero fornecedor de matérias-primas - lítio, cobalto, elementos de terras raras, hidrogénio verde - necessárias para as transições energéticas globais.


As nações poderosas, em particular, continuam a tratar África como uma base de recursos para alimentar as suas ambições de energia verde. E continuarão a fazê-lo, a menos que a UA procure definir a agenda global em vez de a servir. 


A UA depende de doadores externos, o que limita a sua capacidade de traçar o seu próprio rumo e controlar a sua agenda. 


A terceira questão reside no interior da UA: a eficácia interna e a sustentabilidade das suas instituições. Apesar dos esforços da Equipa de Reforma da UA, à qual pertenci, que se concentrou em melhorar as fórmulas de financiamento, a gestão de talentos e a contenção orçamental, ainda há muito a fazer.


A UA continua a depender de doadores externos, o que limita a sua capacidade de traçar o seu próprio rumo e controlar a sua agenda. A falta de independência financeira torna a UA vulnerável a pressões externas, o que, por sua vez, prejudica a sua capacidade de implementar eficazmente as suas prioridades estratégicas.


Além disso, as estruturas de governação interna da instituição, embora melhoradas, continuam a enfrentar desafios significativos em termos de eficácia de gestão e de utilização eficiente dos recursos. 


Enquanto a independência financeira da UA não for plenamente concretizada e os seus mecanismos internos não se tornarem mais ágeis e reactivos, a organização continuará a ser condicionada por uma falta de autonomia. 


É neste contexto que a recente eleição de Mahmoud Ali Youssouf como presidente da Comissão da UA, com Selma Malika Haddadi como vice-presidente, oferece um renovado sentimento de esperança. A sua experiência como diplomatas experientes - bem versados nos meandros da dinâmica diplomática de Adis Abeba - oferece uma verdadeira oportunidade de reforma. 


Youssouf e Haddadi estão perfeitamente conscientes das deficiências que têm afetado a UA e estão numa posição privilegiada para promover as mudanças necessárias. A sua capacidade diplomática e o seu conhecimento político serão cruciais para recalibrar a abordagem de África, tanto a nível interno como na cena internacional.


(*) Carlos Lopes é professor na Escola de Governação Pública Nelson Mandela da Universidade da Cidade do Cabo. Foi secretário executivo da Comissão Económica das Nações Unidas para África e trabalhou extensivamente com a União Africana, incluindo na Agenda 2063 e no lançamento da Zona de Comércio Livre Continental Africana 

CEDEAO expulsa de Bissau, foi "vítima da sua missão inicial", considera ex-PM Aristides Gomes

 FONTE: RFI


A missão política de alto nível da CEDEAO afirma ter sido expulsa da Guiné-Bissau na sequência de ameaças do Presidente Umaro Sissoco Embaló proferidas nesse sentido. O Presidente Sissoco Embaló terá considerado que a missão extravasou as suas funções ao reunir-se com certos líderes da oposição.

Num comunicado publicado este sábado 1 de Março e assinado pelo chefe da missão da CEDEAO, o embaixador Bagudu Hirse, ex-ministro dos negócios estrangeiros da Nigéria, a organização afirma que a delegação "partiu de Bissau na madrugada deste sábado [1 de Março], na sequência de ameaças de S.E (Sua Excelência) Umaro Sissoco Embaló para expulsá-la”.


Contactado pela RFI, um dos membros da missão política da CEDEAO, presente em Bissau desde 21 de Fevereiro, recusou reagir, mas confirmou o caso, alegando que o Presidente Sissoco Embaló terá considerado que a missão extravasou as suas funções ao reunir-se com certos líderes da oposição.


O roteiro inicial da CEDEAO não previa reuniões com líderes da oposição. Depois de cartas enviadas à organização, a delegação cedeu e agendou encontros com representantes do PAI-Terra Ranka e da API Cabas Garandi. 


O Presidente guineense, que se encontra fora do país em visitas de Estado à Rússia, ao Azerbaijão e à Hungria não terá apreciado os encontros entre a CEDEAO e os membros da oposição, Aristides Gomes, ex-Primeiro-ministro da Guiné-Bissau e observador do momento politico conturbado. 


"A CEDEAO está a ser vítima da sua própria problemática inicial. A partir do momento em que a organização chega a Bissau e segue os passos do Sissoco, querendo depois trair esses passos, [o Presidente Umaro] Sissoco reage", afirma ainda Aristides Gomes.


"Sissoco está a ser coerente consigo mesmo. Repare, quando ele chegou ao poder [em 2020] pela via que nós conhecemos, quando assumiu o palácio presidencial apoiado por forças de segurança, ele expulsou as forças da CEDEAO que estavam na Guiné-Bissau e declarou persona non-grata o próprio representante da CEDEAO no país. Esta semana, quando a missão recebeu todas as coligações representadas na Assembleia Nacional, dissolvida ilegalmente [pelo chefe de Estado]; quando os líderes dessas coligações foram recebidos pela missão... Sissoco estava fora do país, mas ele é chefe de Estado e tem informações. Aí compreendeu que a missão estava a evoluir para o caminho da legalidade que ele tinha previamente destruído. Portanto, a missão fez um percurso em que primeiramente seguiu o caminho da ilegalidade do Sissoco. Mas a partir do momento em que a missão, por razões várias, começou a fazer uma inflexão, um percurso inverso, de retorno à legalidade, aí a missão estava a infringir o objectivo fundamental do Sissoco, que é a personalização do poder."


De notar que a CEDEAO deve publicar em breve o relatório final sobre a estadia em Bissau e o diálogo em torno das eleições. 


Para Aristides Gomes, a organização cometeu dois erros. O primeiro, na opinião do ex-Primeiro ministro guineense, foi ter-se reunido com Adja Satu Camará, nomeada pelo chefe de Estado para a presidência da Assembleia Nacional Popular e substituindo Domingos Simões Pereira no cargo, num processo que a oposição indica ter sido realizado à margem do quadro legal.  


O segundo erro da CEDEAO, diz Aristides Gomes, reside no próprio objectivo da missão da organização na Guiné-Bissau. "Os problemas da Guiné-Bissau não se resumem à marcação da data das eleições gerais. Isso decorre da lei eleitoral. Temos que tratar primeiramente da questão do fim do mandato de Sissoco", considera o político. 


De recordar que o chefe de Estado guineense não esperou a chegada da delegação da CEDEAO a 21 de Fevereiro para anunciar a realização de eleições em Novembro 2025.


Ora, de acordo com a oposição e a sociedade civil, que se vincula ao quadro legal e constitucional, o mandato de Sissoco Embaló terminou a 27 de Fevereiro, cinco anos depois de ter tomado posse como presidente da Répública num hotel em Bissau, numa altura em que ainda decorria um contencioso eleitoral. 

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