quarta-feira, 2 de outubro de 2024

ANÁLISE: O que a Guiné-Bissau deve fazer para garantir eleições credíveis

FONTE: PREMIUM TIMES

Por: Paulin Maurice Toupane (*)


Alcançar algum consenso sobre a funcionalidade e a legitimidade das instituições eleitorais é fundamental para promover a estabilidade política.


Os novos membros da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau (Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, ou ANP) serão eleitos no dia 24 de Novembro. Embora estas eleições contribuam normalmente para a democratização e a estabilidade política do país, estão a ser organizadas por instituições que se considera terem perdido a sua legitimidade.


Juntamente com o aumento das tensões políticas nos últimos anos, estas eleições correm o risco de consolidar a fragilidade institucional da Guiné-Bissau. duas razões principais. O primeiro é o desejo do governo de exercer algum controlo sobre a CNE. Em segundo lugar, a ANP não conseguiu eleger o novo presidente e os novos membros do secretariado executivo da CNE devido às dissoluções.


A Comissão Permanente da ANP, actualmente o único braço funcional do Parlamento, poderia eleger membros da CNE. No entanto, não pode reunir-se porque o governo controla a liderança da ANP e substituiu o Sr. Pereira por Adja Satú Pinto – o actual vice-presidente do país e aliado do Sr. Embaló – como presidente.


Para agravar a situação está a paralisia do Supremo Tribunal – também resultante de uma luta pelo seu controlo por parte dos actores políticos, especialmente no período que antecede as eleições. Na Guiné-Bissau, o Supremo Tribunal está mandatado para analisar e validar a elegibilidade dos candidatos políticos e verificar e declarar os resultados finais das eleições. Também é responsável pela resolução de disputas eleitorais.


No entanto, desde a demissão forçada do presidente do Supremo Tribunal, José Sambu, em Novembro passado, este tem estado disfuncional e incapaz de cumprir o seu mandato eleitoral.


Significativamente, seis dos 12 juízes do tribunal que poderiam julgar disputas eleitorais estão sujeitos a processos disciplinares iniciados pelo ex-vice-presidente, juiz Lima André – que atualmente atua como presidente interino. Estes juízes estão atualmente suspensos e, portanto, não podem reunir-se em sessão. Isto significa que o tribunal não tem o quórum de sete juízes necessário para se reunir e deliberar sobre assuntos que lhe são submetidos, incluindo a revisão e determinação da validade ou não das candidaturas. Nem seria capaz de declarar os resultados das eleições.


Para resolver esta disfuncionalidade, o presidente interino do tribunal criou uma comissão técnica ad hoc responsável pelo processo de verificação das candidaturas. O sucesso do comité, no entanto, depende do apoio dos actores políticos envolvidos.


Já existem suspeitas em torno das relações pessoais entre o Sr. Embaló e o presidente interino do tribunal e o impacto que isso poderá ter no processo eleitoral. Isto ficou claro durante entrevistas do Instituto de Estudos de Segurança realizadas em Bissau. A criação da comissão também viola as leis que regem a organização e o funcionamento do tribunal, incluindo o seu mandato eleitoral.


Qualquer rejeição por parte do tribunal da candidatura dos líderes da oposição poderá ser interpretada como uma tentativa de eliminar os adversários do presidente nas eleições presidenciais que se realizam este ano e nas legislativas de Novembro. Especialmente num contexto em que o senhor Embaló declarou que o seu sucessor não seria o senhor Pereira nem dois outros políticos da oposição, Braima Camará e Nuno Gomes Nabiam.


Consequentemente, nem a CNE nem o Supremo Tribunal podem organizar ou supervisionar as eleições legislativas. Para garantir que a situação não se degenera e agrava a crise política, o Sr. Embaló deve dialogar com os intervenientes políticos e institucionais para chegar a um amplo consenso para restaurar a normalidade institucional. Isto é ainda mais importante dadas as tensões persistentes em torno do final do seu mandato e da data da próxima eleição presidencial.


Alguns partidos políticos da oposição já afirmaram que o actual presidente deixará de ser considerado como tal após 27 de Fevereiro de 2025 – data em que termina o seu mandato constitucional.


À medida que as eleições na Guiné-Bissau se aproximam, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental – na sua qualidade de garante do processo de estabilização do país – deve intervir para ajudar a criar as condições para uma eleição pacífica e credível. Para tal, os intervenientes políticos poderiam considerar combinar as eleições legislativas e presidenciais e transferi-las para uma data posterior acordada por todas as partes interessadas.


O adiamento das eleições legislativas daria tempo para resolver as actuais disfunções institucionais e problemas de legitimidade, sendo a eleição do pessoal da CNE e do Supremo Tribunal um pré-requisito fundamental. Isto seria fundamental para criar confiança nestas instituições entre os intervenientes políticos. Seria uma oportunidade para os envolvidos chegarem a um consenso sobre a data da próxima eleição presidencial.


Acima de tudo, evitaria que a legitimidade do presidente fosse questionada após o término do seu mandato, em Fevereiro – uma situação que poderia minar ainda mais a fragilidade das instituições do país.


(*) Paulin Maurice Toupane, Pesquisador Sénior, Escritório Regional do Instituto de Estudos de Segurança (ISS) para a África Ocidental e o Sahel.


(Este artigo foi publicado pela ISS Today, um parceiro de distribuição do Premium Times. Temos permissão para republicá-lo).

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