sexta-feira, 7 de junho de 2024

Antigo PM apresenta queixa-crime contra Presidente da Guiné-Bissau

FONTE: RFI


O antigo primeiro-ministro guineense, Martinho Ndafa Cabi, apresentou nesta quinta-feira, 6 Junho, no Ministério Público uma queixa-crime contra o Presidente Umaro Sissoco Embaló por atentado contra a Constituição, coerção dos órgãos constitucionais e abuso de poder das funções, enquanto chefe de Estado. O presidente do movimento Cidadãos Patriotas denuncia ainda um clima de intimidação e acusa o poder guineense de ter destruído os principais partidos do país.

Qual é a missão do movimento Cidadãos Patriotas da Guiné-Bissau?


Nós criamos o grupo Cidadãos Patriotas para salvar a Constituição e a democracia. Neste país, ao longo destes últimos quatro anos, podemos dizer que já não há democracia. Aqui não há liberdade de expressão, não há liberdade de manifestação, não há liberdade de nada. Os partidos políticos já não podem fazer nada, estão completamente destruídos pelo poder. Nenhum partido funciona. Os partidos estão completamente divididos, porque alguém quer dividir para poder reinar.


Este movimento pretende ser a alternância política no país?


Apresentamo-nos como alternativa a estes partidos que já não reagem, já não conseguem fazer nada. Estes partidos foram neutralizados pelo poder e ninguém consegue fazer nada aqui. Por isso é que nós criámos este grupo de homens e mulheres que querem mudar a situação, o status quo que reina no país.


Foi essa motivação que vos levou a apresentar uma queixa-crime junto do Ministério Público da Guiné-Bissau?


O nosso modus operandi é denunciar todos os actos que atentem contra a Constituição [da Guiné-Bissau]. Apresentamos as queixas-crime, mesmo sabendo que há o risco de se eternizar no tribunal, mas algum dia haverá julgamento. Apresentámos duas queixas, uma queixa contra o vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Lima André, por usurpação de poder. Ele sabe que a forma de chegar ao cargo de presidente do Supremo Tribunal de Justiça é através de eleições com os pares. Ele não esperou por isso, porque o seu colega, o presidente cessante, pediu demissão e ele nem sequer esperou que ele saísse, foi arrombar a porta dele e começou a funcionar como se fosse o Presidente do Supremo Tribunal.


A outra queixa crime diz respeito ao Presidente da República que acusam, nomeadamente, de ter atentado contra a Constituição…


Exactamente. O Presidente guineense dissolveu o Parlamento, quando a lei diz que quando os partidos políticos saem das eleições o limite para a dissolução das instituições são 12 meses.


Acusam ainda o Presidente de tentativa de silenciar os adversários políticos para satisfazer os compromissos dos apoiantes…


Acusamos o chefe de Estado de atentar contra a Constituição da República e de coagir os órgãos constitucionais. É abuso de poderes. Tudo isto consubstancia, no quadro legal, as violações que ele fez durante este tempo. Quer silenciar os dois grandes órgãos de soberania. A Assembleia Nacional Popular e o Supremo Tribunal de Justiça.


Já tiveram alguma reação da parte do Presidente da República Umaro Sissoco Embaló?


Não, não tivemos nada. Apresentamos as queixas-crime junto dos órgãos competentes do Estado. Como não foi entregue nenhuma cópia, ainda não há reacção da parte dele.


O que esperam da justiça guineense?


Apresentámos a queixa junto do Ministério Público. Agora vamos aguardar durante 30 dias e se não houver reacção dos tribunais, vamos seguir em frente. Vamos solicitar os tribunais de Comunidade Económica dos Estado da África Ocidental-CEDEAO. Estamos determinados.


Consideram que a Comunidade Económica dos Estado da África Ocidental é uma instituição credível para se pronunciar sobre a Guiné-Bissau?


Primeiro, confiamos na nossa justiça interna. Porém, se não houver uma tomada de decisão da parte dos nossos tribunais, vamos para os tribunais da CEDEAO.


E se não tiverem resposta da CEDEAO?


Nesse caso vamos avançar para a União Africana.


Afirmou que os partidos políticos na Guiné-Bissau estão a ser silenciados. Não receia que possa acontecer o mesmo com o movimento - Cidadãos Patriotas?


Somos homens adultos, maioria combatentes da liberdade da pátria- quadros que viveram a abertura política- que foram promotores da democracia e que não querem assistir a um retrocesso no processo democrático. Já lá vão 34 anos que nós estamos a viver em democracia e hoje, já no século XXI, estamos a assistir a um retrocesso total. Não há liberdade de expressão, não há liberdade para os nossos cidadãos fazerem uma simples marcha, por exemplo. Não há liberdade para nada e os policiais prenderem todos os jovens, levam-nos para a prisão onde são chicoteados. É impossível, no século XXI, conviver com essa realidade.


Não receia pela sua segurança?


Deveria recear pela minha segurança? Eu sou um quadro político. Neste caso, tenho duas opções. Ou vivo bem, tenho um futuro bom, ou espero por aquilo que pode acontecer e sem problemas. Foi isso que os nossos mais velhos fizeram, optando por lutar contra o colonialismo até à independência. Quando iam para a mata, sabiam que ou morriam ou vinham com a liberdade. E é isso que nós estamos aqui a fazer.