segunda-feira, 20 de maio de 2024

FRENTE POPULAR - Manifestantes libertados denunciam tortura na prisão

 FONTE: RFI

Na Guiné-Bissau, foram soltas na noite passada largas dezenas de pessoas, pelo menos 61.Trata-se de manifestantes que tinham sido detidos por participarem em marchas no sábado sob o lema "Contra violência e destruição da democracia ", um protesto da Frente Popular. Vitorino Indenque, coordenador nacional da rede de defensores de direitos humanos, alega que manifestantes, entretanto soltos, denunciam a tortura que sofreram na cadeia.


RFI: Confirma que estas largas dezenas de pessoas foram libertadas?


Vitorino Indenque: Primeiro vamos lamentar a detenção das pessoas que estão a exercer um direito de liberdade de manifestação. A nossa lei prevê e não só, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e em vários instrumentos que a Guiné-Bissau ratificou, pelo que se alguém quer manifestar-se para poder chamar à atenção sobre a situação crítica do país, pode fazê-lo, observando a lei porque temos uma lei especial e uma lei de liberdade de manifestação para manifestar. O importante é avisar as autoridades, mormente o Ministério do Interior, para poderem garantir a segurança. Não há nada que exigir, por exemplo, ao nível de autorização. Não há autorização para fazer uma manifestação na Guiné-Bissau. Não deve haver.


RFI: Então, porque é que as autoridades não autorizaram? Porque é que reprimiram?


Vitorino Indenque: Porque produziram um despacho ilegal, que proíbe todas as manifestação para um tempo indeterminado. Mas o mesmo despacho que produziram eles mesmos, enquanto políticos, fazem todos os dias as manifestações dos comícios populares e só eles é que podem manifestar. Ninguém pode. Se alguém quiser levantar a voz sobre a situação do país, essa pessoa é perseguida e humilhada. É assim a situação. Por isso é que quando a Frente Popular iniciou as movimentações para poderem fazer uma marcha pacífica, todas as entidades foram avisadas... A Câmara Municipal de Bissau e outras entidades porque a lei prevê só o Ministério do Interior, mas mesmo assim alguém tem que informar a Câmara Municipal para poder ver o itinerário e também a secretária de Estado, a instituição que lida com o troço para poder evitar constrangimentos. E a marcha deve ser só feita entre sábado e domingo. Todos esses requisitos foram verificados. Eu não sei porque é que o secretário de Estado o fez. Disseram que não deixámos o número de contacto na carta que endereçaram a essas entidades. São coisas pequenas que pegam só para poder impedir as manifestações.


RFI: Refere-se ao secretário de Estado da Ordem Pública?


Vitorino Indenque: Sim, sim. São coisas pequenas em que pegam para poder impedir a manifestação. Estamos no Estado de Direito e num momento crítico do país. Ninguém pode fazer nenhuma manifestação. E nós, enquanto defensores dos direitos humanos, queremos chamar à atenção [para a situação do país]. Houve sessões de sensibilização das pessoas para poderem participar numa marcha ordeira e pacífica. Eu não vejo a razão de tanta detenção de pessoas, de tanta carga, força bruta para com os defensores de direitos humanos e as pessoas que queriam que as coisas mudassem no país. Estão a chamar a atenção para que as coisas mudem porque a marcha era contra a fome, contra a violência e a destruição da democracia. Todos esses requisitos foram verificados... A marcha era para chamar à atenção das autoridades que as coisas não estão a correr bem.


RFI: E agora têm noção de quantas pessoas ainda estão detidas? Largas dezenas já foram soltas. Confirma?


Vitorino Indenque: Sim. É uma liberdade parcial. O grosso dos números já estão soltos. Parece que ainda estão detidas entre oito a nove pessoas.


RFI: Incluindo Armando Lona.


Vitorino Indenque: Eu não sei se o Armando Lona está lá, mas tenho a informação de que três pessoas de Gabú, duas pessoas de Bafatá e de algumas individualidades que estão na cabeça da organização da marcha.


RFI: As pessoas que foram soltas puderam relatar-vos as condições da detenção? O que é que aconteceu com elas?


Vitorino Indenque: Sim, sim. Até demos uma entrevista. Houve tortura, todos foram torturados. Tortura. Há pessoas encapuzadas que estão lá para torturar. O objetivo é desencorajar mais marchas no país, mais manifestações no país. E vamos continuar com esse tipo de ambiente daqui para frente porque já se avizinha o calendário eleitoral e os políticos já estão a fazer comícios. Entretanto, quem está no poder vai criar manobras para poder evitar a situação de manifestação. E vão continuar porque as pessoas também não vão poder ficar todos quietos a ver a situação a piorar no país.