segunda-feira, 14 de agosto de 2023

"Não vejo motivos para Sissoco resgatar Nabiam"

FONTE: DEUTSCHW WELLE


























O Presidente guineense nomeou cinco membros do Governo cessante para conselheiros da presidência. Analista ouvido pela DW diz que iniciou-se um novo capítulo que pode "culminar numa crise político-constitucional".


Entrou esta segunda-feira (14.08) em funções o novo Governo guineense liderado por Geraldo Martins. O Presidente Umaro Sissoco Embaló nomeou este fim-de-semana o novo elenco governamental, constituído por 19 ministérios e 15 secretarias de Estado. Os membros do Executivo tomaram posse este domingo, em Bissau. 


No entanto, ainda antes de ser conhecido o novo Governo, o país foi surpreendido pela nomeação de cinco membros do Executivo cessante para conselheiros da presidência "com direitos e regalias" inerentes aos cargos de primeiro-ministro e ministros de Estado. 


Entre os novos conselheiros está Nuno Nabiam, ex-primeiro-ministro que pediu demissão do cargo há uma semana. O ex-vice-primeiro-ministro, Soares Sambú, é agora ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência e Suzi Barbosa, ex-chefe da diplomacia do país, passa agora a conselheira especial do Presidente para a política externa.


Já Viriato Cassamá, que foi ministro do Ambiente e da Biodiversidade no Governo cessante, foi nomeado Conselheiro para Assuntos Climáticos e Ambientais, de acordo com o decreto presidencial número 49/2023, divulgado no sábado (12.08). 


"Uma afronta ao novo Executivo"


À DW, o analista político Rui Jorge Semedo salienta que, embora não se verifique nenhuma ilegalidade, o posicionamento de Umaro Sissoco Embaló pode ser visto como "uma afronta ao novo Executivo".


"Percebendo que a partir de agora não terá influência no funcionamento do novo Executivo, o Presidente decidiu promover um Governo paralelo na Presidência da República e que, com certeza, pode vir a provocar algum mal-estar entre a presidência e o Executivo", explica.


Aos recém-empossados membros do Governo, o Presidente da República prometeu este domingo total colaboração, mas para o analista, Sissoco Embaló acabou por contrariar tudo o que tem vindo a apregoar. Rui Jorge Semedo questiona ainda a escolha dos conselheiros.


"Nuno Nabiam, aliás, nem tinha exercido o poder que um primeiro-ministro exerce dentro do que são as suas competências constitucionais na Guiné-Bissau. E agora não vejo motivos para o Presidente da República resgatá-lo na presidência e com todas essas regalias".


Segundo o decreto presidencial, além de Nuno Nabiam, Suzi Barbora, Soares Sambú, Marciano Barbeiro e Viriato Cassamá terão "direitos e regalias" (NOTA: O actual Governo não tem ministro de Estado) inerentes ao cargo de primeiro-ministro e ministros de Estado.


O analista guineense Sumaila Djaló alerta para o impacto desses encargos num país onde a dívida pública ronda os 80% do produto interno bruto (PIB).


"É um país com salários em atraso em diferentes setores da administração pública. O Presidente tinha decretado a exoneração de todos os seus conselheiros na presidência com a justificação de que era preciso fazer cortes na função pública para dar mais folgo às nossas finanças públicas. E, em menos de um ano, para contentar os seus aliados e preparar terreno para as próximas eleições presidenciais, volta a nomear com encargos superiores", frisa.


Um Presidente "autoritário e absolutista"


As consequências das contratações para o Orçamento Geral do Estado também inquietam Rui Jorge Semedo.

"O Presidente da República e o seu Governo da época decidiram mandar mais de 20 médicos para casa alegando que o país não tinha condições para os pagar. Agora, sim senhor, o país já tem condições para pagar um conjunto de assessores que vão estar lá para não fazer nada", reivindica. 


Sumaila Djaló não tem dúvidas de que iniciou-se um novo capítulo que pode "culminar numa crise político-constitucional". Defende que o respeito às leis e ao princípio de separação de poderes, é o único caminho para evitar o choque entre o executivo e o chefe de Estado, mas isso não vai acontecer, lamenta.


"Sobretudo porque temos um Presidente da República disposto a fazer de tudo para se manter no poder, o que é legítimo, mas o caminho que ele escolhe é de destorção das leis e de afronta às outras instituições. É um Presidente autoritário e absolutista que não vai facilitar a estabilização do país que é preciso", sublinha.


Djaló admite que ainda é cedo para uma análise ao novo Executivo da Guiné-Bissau, mas adianta que não alimenta grandes expectativas. Para já, considera que o Governo é "muito volumoso" tendo em conta o "gritante" défice orçamental do país e critica o "desequilíbrio de género" com nove mulheres, entre ministras e secretárias de Estado, num total de 34 membros.

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